COMENTANDO A PALAVRA DE DEUS
Meus queridos Amigos e
Irmãos na Fé!
A
Palavra de Deus do Segundo Domingo da Quaresma nos permite uma espiadinha no céu, através do evento da Transfiguração
do Senhor diante de três discípulos: Pedro, Tiago e João na Montanha
Sagrada.
A
página do Livro de Gênesis nos leva a pensar que, de quando em vez, Deus brinca
conosco. Não é possível à nossa razão, um Deus de Amor pedir a Abraão, que
sacrifique seu próprio filho. Mas não é brincadeira de Deus, e sim uma
pedagógica provação da maturidade da fé. Será que somos realmente fiéis à
Aliança que Deus selou conosco? É lógico que Ele não quer sacrifícios, muito
menos de vidas, mas fidelidade. O holocausto Ele já tem preparado; é Seu Filho
Amado. Por isso, o episódio narrado em Gênesis de hoje, remete-nos à Paixão e Morte de Jesus na cruz.
As provações que a vida nos impõe, ou amadurecem nossa fé
em Deus, ou nos revoltam e afastam d’Ele. Sempre dependerá de nossa eleição
pessoal.
Ao nosso redor, tantas coisas mexem com o coração e
desafiam a nossa fé. Tantas pessoas que se afastaram das nossas comunidades.
Milhões de crianças que moram nas ruas, na mais triste pobreza. Tantos jovens
entregues às drogas.
É incontável
a fila de irmãos e irmãs que passam fome e não tem casa para morar. Entre os
poderosos e donos do dinheiro imperam o egoísmo, a concentração de poder, os
privilégios. São milhões os sobrantes e excluídos da mesa da vida, no dizer dos
Bispos em Aparecida.
O
que essa situação tem a ver com a nossa preparação para a festa da Páscoa e com
o evangelho da Transfiguração de Jesus.
Como a narrativa da Transfiguração está no centro do
Evangelho de Marcos, o evangelista quer responder a uma pergunta bem concreta:
Quem é Jesus? O povo vai descobrindo que ele é o Messias. Mas não um
Messias milagreiro, rei glorioso, vencedor, rico, poderoso, capaz de mudar
rapidamente a condição da humanidade e fazer acontecer num rito mágico a
presença do Reino. Pedro, na montanha, tem essa idéia e acredita que o reino,
simbolizado nas três tendas, pode acontecer sem a doação, sem os sacrifícios,
sem a morte e a entrega da vida.
Hoje,
nas filosofias do mundo, somos contaminados por falsas expectativas como as
presentes na conversa de Pedro na montanha. Ter fé significa entrar nos
desígnios de Deus que frutifica na solidariedade com os irmãos. A
doação na força da páscoa de Jesus nos transfigura por dentro e por fora.
Transforma a situação e a realidade dos abandonados e dos privados do
necessário para viver e cantar a vida: saúde, pão, terra, casa, salário digno,
respeito e amor pela vida...
A fome do irmão, as crianças abandonadas nas ruas, as
violências ao ser humano são chamadas de Jesus para subirmos com ele a um monte
alto e entrarmos nos desígnios de Deus Pai, depois descermos da montanha e
fazermos a nossa parte. Páscoa é isso: passagem de situações de menos vida para
situações de mais vida, de situações de pobreza e miséria para uma vida digna,
bonita, feliz e realizada para todos.
Na leitura da carta aos Romanos, aprendemos que o amor de
Deus Pai é imenso, gratuito, generoso, infinito e que não pode ser destruído
por nenhuma quebra da aliança ou infidelidade por parte do ser humano.
Acolhamos o convite deste Segundo Domingo da Quaresma,
deixando-nos transfigurar com Jesus e, também transfigurarmos a vida
desfigurada de nossos irmãos cuja dignidade lhes foi tirada por conta do
consumismo, do hedonismo e do egoísta individualismo.
Debrucemos nossa esperança sobre a possibilidade de dias
melhores. Uma das mais edificantes visitas que fiz, nos meus 25 anos de
ministério ordenado, foi há algum tempo: entrando no quarto de um irmão enfermo
pensei: Este moço é um santo!... A santidade dele se fazia sentir
naquele quarto. Nem bem terminara de pensar, a irmã que cuida dele, disse em
voz alta: “Padre, este meu irmão é um santo. E tem mais: ele me ensina a
santidade... faz 57 anos que ele se encontra acamado e sempre sorridente e
agradecido a Deus. Nunca meu irmão reclamou de nada...”
Diante
daquela realidade, do semblante sereno e agradecido do moço, senti muita
vergonha pelas vezes em que reclamei da vida. Isso não significa que devamos
ficar passivos à precária Saúde Pública, que não raras vezes
trata das pessoas como se fossem bichinhos. Todos somos conclamados a promover
a dignidade e rezar com a Campanha da Fraternidade “Eu vim para servir” (cf. Mc 10,45).
Desejando-lhes muitas bênçãos e saúde, com ternura e
gratidão o abraço amigo e fiel,
Pe. Gilberto kasper
(Ler Gn
22,1-2.9-13.15-18; Sl 115(116B); Rm 8,31-34 e Mc 9,2-10)
Fontes: Liturgia Diária da Paulus de Março de
2015, pp. 17-20 e Roteiros Homiléticos da CNBB da Quaresma de 2015, pp. 27-35.